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Mai 07
De 17 a 20 de Maio, a vila alentejana de Mértola volta a ser a capital do Islão em Portugal. Num momento em que a tese do "conflito de civilizações" perde terreno, devido aos desastres do Iraque e do Afeganistão, o diálogo e o conhecimento mútuo ganham visibilidade nas ruas de Mértola, transformadas numa medina típica de uma cidade mediterrânica. É o quarto festival islâmico que toma conta da vila-museu. Sobre o festival e as novas iniciativas do Campo Arqueológico de Mértola, o Esquerda conversou com o arqueólogo Cláudio Torres.

Em Dezembro de 2001, era inaugurado o museu Islâmico de Mértola, que passou a exibir as melhores peças de arte islâmica descobertas nas escavações de mais de 20 anos do Campo Arqueológico. Desta vez, a inauguração é do Centro de Estudos Islâmicos e do Mediterrâneo. "Abrimos novas portas, num momento em que o outro lado do Mediterrâneo é fundamental para a Europa", explica Cláudio Torres. "Este centro pode ser um pivô muito importante nesta aproximação."

O centro vai ter uma biblioteca especializada em estudos islâmicos de cerca de 25 mil volumes - que contou com a doação da biblioteca pessoal de José Mattoso -, um espaço para exposições temporárias - onde vai ser inaugurada, no mesmo dia, a mostra "Mértola, o último Porto do Mediterrâneo", de Santiago Macias -, e as instalações do próprio Campo Arqueológico de Mértola (CAM), que se muda de armas e bagagens para a "Casa Amarela", um edifício setecentista que foi recuperado para ser a nova sede. É aqui também que vai funcionar o mestrado de desenvolvimento local, ministrado pelo CAM em cooperação com a Faculdade de Economia da Universidade do Algarve.

Em Outubro, vai arrancar o novo mestrado em Civilização Islâmica, também em colaboração com a Universidade do Algarve. "Todo este processo, que já dura 30 anos, em que andámos à procura do Islão e das suas raízes, deu origem a uma equipa cada vez mais complexa. Para além da investigação, também nos virámos para o local, de certa forma para justificar diante da população o que andávamos ali a fazer", recorda Cláudio Torres. "Mas desde o início queríamos virar-nos também para a área formativa."

Nos últimos anos, o CAM reforçou contactos com outros centros do Al Ândalus com o objectivo de reforçar o trabalho em rede. O Centro de Estudos Islâmicos e do Mediterrâneo já é um fruto deste trabalho em rede. No mesmo dia da inauguração, serão assinados protocolos entre o CAM e as universidades do Algarve, de Évora, de Granada, de Manouba (Tunísia) e de Moulay Ismail (Marrocos). "O objectivo é fazer uma rede de mestrandos e doutorandos que comece a formar um corpus de investigadores que, conforme a sua especialização, possam prosseguir a sua formação em qualquer destas universidades", destaca Cláudio Torres. Por outro lado, o novo mestrado decorre em Mértola, "o que permite criar uma dinâmica cultural e formativa de um certo impacto local e nacional." Será a Mértola que se deslocarão conferencistas de Évora, de Lisboa, de Granada e de Paris. As inscrições começam no próximo mês.

Em tempos de fracasso do chamado "conflito das civilizações", as actividades do CAM apontam para a alternativa do conhecimento mútuo. "Não há outro caminho", afirma Cláudio Torres. "Só podemos dialogar com quem conhecemos. É pelo contacto que passa o conhecimento da civilização islâmica, conhecimento este que está ainda em perigo devido aos fundamentalismos dos dois lados. Mas há muita gente a procurar intercâmbio e a querer conhecer-nos."

Para além da inauguração do novo Centro, o CAM promove também no primeiro dia do Festival Islâmico uma homenagem a um dos seus fundadores, António Borges Coelho. Autor de uma vasta obra científica e literária, Borges Coelho iniciou a investigação moderna sobre o Islão. "É o nosso totem", brinca Cláudio Torres. A apresentação será feita pelo ex-reitor da Universidade de Lisboa José Barata Moura.

Para além disso, o que vai encontrar em Mértola o visitante do Festival (na última edição houve 30 mil)? "O principal é a rua, o comércio, a recriação de uma medina mediterrânica. Esta vila, às vezes mortiça, transforma-se, surge uma actividade intensíssima. É muito importante este encontro com o seu próprio passado longínquo", conclui Cláudio Torres.



Caixa 1

Escavações trazem à luz novas descobertas

Uma escavação em obras na biblioteca municipal de Mértola trouxe à luz novas e importantes descobertas na vila Museu. Os arqueólogos do Campo Arqueológico de Mértola têm procurado deter as escavações nos níveis islâmicos, ao contrário do que se fazia antes, quando se procurava principalmente o romano e se descartavam os níveis superiores. Mas há situações em que é necessário afundar mais e ir além do nível islâmico. Foi o que aconteceu desta vez. "Encontrámos muralhas do período republicano romano, e muralhas monumentais do período púnico, dos séculos IV e III a.c.. São muralhas de uma monumentalidade especial", explica Cláudio Torres. O arqueólogo assinala que já se sabia, por relatos, da importância que "o último porto do Mediterrâneo" teve no período fenício e púnico, "mas agora é palpável". As escavações estão à espera de decisões finais para a sua musealização.



Caixa 2

Exposição virtual "À descoberta da Arte Islâmica"

No final de Abril foram inauguradas as 18 exposições virtuais "À Descoberta da Arte Islâmica no Mediterrâneo" na Internet. Através delas, é possível ter acesso a 204 monumentos e 603 objectos provenientes de 14 países, entre os quais Portugal. A iniciativa é do Museu Sem Fronteiras, uma organização não-governamental fundada em 1994 e gerida com fundos europeus e verbas de 17 países-membros. Nesta exposição, pela primeira vez, "é possível ligar o objecto saqueado do Mediterrâneo e que foi metido num museu europeu com o seu lugar de origem", explica Cláudio Torres. Cada peça apresentada, em imagem que pode ser ampliada para alta resolução, pode ser admirada na Net, junto com a informação correspondente. Além disso, é possível aceder a referências históricas, como uma cronologia dos acontecimentos do respectivo país, ou de outros do Mediterrâneo, da época a que a peça pertence.

O Campo Arqueológico de Mértola foi a entidade organizadora desta exposição em Portugal. Do nosso país, pode-se apreciar o que há de mais importante da arte islâmica.
Veja o programa completo do festival
http://www.cm-mertola.pt/

Veja a porta de entrada da exposição

http://www.discoverislamicart.org/exhibitions/ISL/

fonte: http://www.esquerda.net/index.php?option=com_content&task=view&id=2793&Itemid=28

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